Considero o trabalho do
João Belga (Luanda,1968), apesar de algumas derivas, bastante consistente. Ancorado nas referências musicais e literárias é um "apropriador de imagens". Na sua obra, onde se podem rastrear a influência de
Raymond Pettibond ou do
cut up de
William Burroughs, há uma componente muito sinestésica
. Já se aproximou da instalação ou do vídeo, mas continua sempre às voltas com a pintura que se caracteriza por uma alta dose de ambiguidade figurativa e icónica. Não se preocupa em definir questões como ruptura, continuidade ou mudança. Fala abertamente da fase negra em que esteve agarrado à heroína.
WB-Mantém ainda as mesmas técnicas de abordagem desde a exposição
Art Attack em 1997?
JB-Sim, as premissas são as mesmas. Vou coleccionando imagens, sobrepondo-as e apagando. É aquela prática do palimpsesto e, por outro lado, uma técnica que tem a ver com o scratch dos DJs. Apago o que não me interessa e fica só o ruído ou decido pintar tudo bem pintadinho em acrílico e depois coloco por cima spray e marcadores.
WB- E o recente interesse pela fotografia?
JB-Tem a ver com a maneira como pinto. É uma base do meu trabalho, depois surgiram alguns projectos relacionados com o
hardcore e aproveitei para expor. Gosto de fotografar, de procurar o contraste do preto e branco.
WB-
Gerard Ritcher...e a inspiração
Raymond Pettibon.
JB- Bem...(risos) continuo a achar que sou um pintor. Nas telas a preto e branco citei
Pettibon. Também aprecio o
Jonathan Meese.
WB- Falemos das suas referências literárias que até coincidem com as minhas.
JB-Claro.
David Foster Wallace,
Michel Houllebecq e
Chuck Palahniuk.
WB-Extravagantes, controversos e provocadores. Já agora em que medida a heroína interferia no seu trabalho?
JB-Não conseguia pintar sem heroína. Na altura da ressaca não sabia se poderia voltar a pintar e consumia mais. Demorava imenso tempo a acabar um quadro. Era uma fantasia minha porque, depois de deixar a heroína, continuei a pintar.
WB-Quais são as suas aspirações?
JB- Tento encontrar a felicidade através de coisas simples, mas não deixo de me questionar. Procuro que isso se traduza no meu trabalho que é uma espécie de working in progress.
WB-Não sente necessidade de reconhecimento do mercado?
JB-Consegui um caminho pessoal e interessa-me mais ter uma acção artística ao nível da sociedade. Isso do reconhecimento pode ser difícil de gerir. Só me sinto deprimido quando não consigo desenvolver um projecto.