domingo, 19 de abril de 2020

Slavoj Zizek

O filósofo esloveno acredita que é possível, mais do que nunca, "conter os totalitarismos e fortalecer os laços de comunidade ante a flagrante incompetência dos líderes frente a crise. Retorno ao “normal” é o que eles querem. Mas as mudanças são para já", diz numa entrevista ao jornal italiano La Republica. “Um novo senso de comunidade: é isso que está emergindo dessa crise. Uma espécie de novo pensamento comunista, distante do comunismo histórico. A banal descoberta de que coordenação e cooperação globais são necessárias para combater o vírus tem um viés revolucionário. Estamos redescobrindo o quanto precisamos uns dos outros. No entanto, a Organização Mundial da Saúde sempre o repetiu: e, em vez disso, não existia nada similar nem mesmo dentro da União Europeia”.O filósofo Slavoj Žižek, 71 anos, autor de ensaios famosos anos, acha que a pandemia vai mudar as nossas vidas. realidade já mudou. "Vemos governos conservadores adoptando medidas que chamaríamos de socialistas noutros tempos: Donald Trump ordena às indústrias privadas o que produzir. Boris Johnson nacionaliza temporariamente as ferrovias. Todos vivemos de uma maneira que seria impensável há poucos meses. Alguns pensam num mundo em que se aproveitará do vírus para nos controlar e, é claro, é uma possibilidade. Mas não acredito em novos totalitarismos: são precisamente os governos que estão em pânico hoje, incapazes de controlar a situação, e muito menos construir uma sociedade no estilo Big Brother. No máximo, há mais desconfiança em relação às instituições. Mesmo na China, testemunhamos protestos, ainda que modestos. Bem, deveríamos encontrar uma maneira de reconstruir essa confiança. Talvez com novos Assange capazes de desmascarar os abusos. Certamente, o vírus mostra que cabe a nós, aos cidadãos, sujeitar a maior controle aqueles que governam e não o contrário.
"Alguém disse que, no meio dessa crise, deveríamos nos preocupar apenas com a nossa salvação. Penso o contrário: não há momento mais político do que o actual. Apesar das advertências dos cientistas, os governos se descobriram despreparados. Mas agora somos forçados para enfrentar o pior, é claro: não há mais espaço para o “America First”e slogans do tipo. Para sobreviver, os Estados a partir de agora terão que lidar continuamente com o futuro. Precisamos de um novo sistema de saúde pública global e agências internacionais aptas a agir com acções acordadas. Precisamos de salários mínimos garantidos, pagos agora inclusive por Trump. Minha ideia de comunismo não é o sonho de um intelectual: estamos descobrindo na nossa própria pele por que certas medidas devem ser tomadas no interesse geral. Não subestimemos o impulso que o vírus está dando a novos sistemas de solidariedade ao nível local e global. Construir um novo modo de viver será o nosso teste. Mas as pessoas precisam retomar as coisas em suas mãos agora: não esperar o fim da crise".

Sem comentários: